Dez primaveras e um convite à inquietude

Bárbara Amorim*

Bárbara Amorim é jornalista formada pela UFRRJ em 2016-1, escritora e criadora de conteúdo digital.

O ano é 2010. O Brasil era presidido por Luiz Inácio Lula da Silva, candidato pelo PT – Partido dos Trabalhadores. Neste mesmo ano, elegíamos, pelo mesmo partido, a primeira mulher para o cargo de presidência da república, a mineira Dilma Rousseff. Agora, caminhe comigo. O ano é 2020. O Brasil é presidido por Jair Bolsonaro, ex-capitão do Exército, empossado pelo PSL – Partido Social Liberal. Enfrentamos, desde o fim de fevereiro, uma pandemia global, a chamada Covid – 19, que já matou mais de 150 mil pessoas em solo brasileiro. Com essa conjuntura nada auspiciosa, completamos também dez anos do curso de Jornalismo da UFRRJ – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Comemoramos assim, dez primaveras de amor e luta, mas distantes, cada um no seu quadrado, como já bem vem à memória as aulas de Teorias da Comunicação, da professora Rejane de Mattos. Se, por um lado, o momento pede isolamento social, por outro, memórias e afetos se unem quase que em uma dança coletiva. É verdade, as capivaras estão mais longe, o pôr do sol mais colorido de todos não passeia por nossas vistas, nem avistamos os cachorros interessados em termos acadêmicos.

O aniversariante da década, @jornalismo, não pode nem apagar suas velas para evitar respingar saliva. Obviamente, mesmo que ainda tenha a idade de uma criança, já faz inúmeros questionamentos em sua mente repleta de interrogações. Ele pensa: “será que as universidades públicas estão preparadas e devidamente equipadas para aplicarem aulas via Zoom ou Google Class sem prejuízos no aprendizado? Será que os professores mais antigos e tradicionais, que são mais adeptos aos meios offline do velho Jornalismo se sentem confiantes para instruírem seus alunos? E as plataformas das universidades, como o Sigaa, utilizado pela nossa querida Rural, vai ficar de pé? E a tal da inclusão digital, existe mesmo? É verídica a imagem retratada na propaganda bolsonarista do Enem, cujos estudantes teriam acesso a Iphones e demais aparatos digitais modernos ou essa é mais uma visão de bolha?”. Como vimos, não há idade para iniciar os estudos do campo da problematização.

De fato, são muitos os desafios que preenchem as páginas do futuro tingido à incerteza. Ninguém disse que seria fácil, né? E possivelmente, nem tão cedo será. O Jornalismo, como um todo, pede cada vez mais coragem. Poderia falar aqui também em frieza, afinal, é preciso no mínimo um bom estômago para comunicar diariamente a extensa lista de mortos pela pandemia só no Brasil, mas seria muita ousadia falar em frieza quando certamente não é disso que nós, jornalistas, precisamos. Ficamos, então, com a coragem, combinado?

Aliás, se parar e reparar bem, essa menina esperta chamada coragem foi personagem cravada em nossa história ruralina. Com ela, nossos voos foram impulsionados e, mesmo sem os melhores equipamentos, programas essenciais não originais, no bom eufemismo, lapelas improvisadas e até a ausência de uma sala de aula para as orientações de TCC, não fomos barrados na Disneylândia. Ou seria Ruralândia? O que importa é que chegamos lá, lá nos congressos, lá nos debates, lá nas pesquisas. Mesmo diante dos obstáculos, nosso curso foi alvo de muitas vitórias. Disputamos e vencemos prêmios em congressos importantes com concorrentes altamente equipados! Vibramos como democratas sonhadores, hoje, íntimos das lágrimas, progressivamente apenas salgadas, entretanto, esculpidos de luta.

Talvez, no amanhã de algum ano mais amoroso, devêssemos fazer uma festa para nos embriagarmos de afeto, mas, por agora, é justo ficarmos na casa de nossas lembranças. É justo lembrarmos de como chegamos até aqui através da expansão das universidades e, como podemos caminhar para expandir ainda mais os nossos horizontes, mesmo em meio à cegueira coletiva. Abraçados na inquietude, quem sabe, tenhamos um destino.

*Bárbara Amorim é jornalista formada pela UFRRJ, turma 2016-1, escritora e criadora de conteúdo digital.